Ronaldo Cagiano lê Golegolegolegolegah!

GOLEGOLEGOLEGOLEGAH! ou Sobre o homem e seu deslugar no mundo

Em seu segundo livro, Golegolegolegolegah! (Ed. Travessa, Curitiba, 2013) , o escritor paranaense Marcio Renato dos Santos, que estreou com o volume de contos Minda-Au (Ed. Record, Rio), traz seis histórias que são amalgamadas por uma temática peculiar: a solidão e a insularidade de seus personagens.

Protagonistas que, muitas vezes, vivem no limite entre a realidade e o delírio, caminhando num limbo psicológico e afetivo e outras situações que determinam suas existências carregadas de angústia, silêncios & incomunicabilidades. São seres que reverberam os sintomas da vida no mundo contemporâneo, tão apequenada pelos conflitos & dilemas individuais e coletivos.

O primeiro conto, que dá título ao livro, remete-nos a um a um escritor em plena crise criativa, em busca de si mesmo ou de um fio condutor para sua narrativa. Perdido e sem norte, procura rumos enquanto reflete sobre seu quotidiano & o ofício. Um homem às voltas com um horizonte intangível, contemplando de um patamar a cidade que nem sempre é a mesma que ele vê. Ele está ali e não está. Seus delírios de percepção colocam-no frente a frente com sua angústia existencial, ao mesmo tempo em que narrador e personagem digladiam-se em torno de um texto em construção, que vacila e não deslancha, no mesmo diapasão em que seus conflitos vão sendo des(a)fiados. É um conto paradigmático sobre os impasses de alguém povoado de incertezas, esse vivente que muito bem poderia ser acometido das mesmas inquietações, estando em Florianópolis ou Cataguases, em Teerã ou Curitiba, em João Pessoa ou Paris; ou chamar-se Noel ou Tavares, Douglas ou Salomão, eis a questão que suscita ao leitor o mesmo percurso, na tênue fronteira entre a realidade e a fantasia.
Como afirma Fábio Campana na apresentação do livro, esses personagens “são universais porque expressam a humana fragilidade imposta pela finitude, sofrem da angústia da incomunicabilidade, se deparam com suas incompletudes”. 

Márcio mapeou algo ancestral e sempre presente - a angústia humana - ao mesmo tempo em que de seus textos emerge um diálogo com grandes mestres da narrativa, tanto pela temática quanto pela estrutura. Exemplo é o conto “Nevoeiro”, contado a partir da perspectiva de um morto, surreal e machadiano. 

Gogegolegolegolegah! enfeixa contos curtos, que são verdadeiras pérolas, pontuadas por uma linguagem sóbria e sem afetações estilísticas. As histórias de Marcio Renato dos Santos fazem uma exegese sobre esse grande e estranho mundo em que (escre)vivemos, com seus fetiches e etiquetas, com seus encontros & desencantos, marcado por uma profunda sensação de alheamento e deslugar, algo que potencializa os nossos desatinos, aprofunda o individualismo e por isso mesmo revestem-se de um universalismo, porque dizem respeito às pungentes re(l)ações e emoções do indivíduo, encontradiças em qualquer lugar do mundo.

Ronaldo Cagiano 

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