Igual, mas diferente

A impressão que se tem de uma cidade depende da maneira como se é recebido no local. Porto Alegre, para mim, é sinônimo de livros, de convívio e de alegria. Em 2002, aterrissei pela primeira vez na capital gaúcha para uma temporada de 40 dias e outras 40 noites.

Naquele ano, o Paraná foi o estado convidado e, como eu fazia parte da equipe da Imprensa Oficial do Paraná, o diretor-presidente, Miguel Sanches Neto, me designou para estar de corpo presente durante o período do evento.
Foi uma experiência que me deixou com ótima impressão dos gaúchos. Eu acompanhava autores paranaenses que participavam de mesas, frequentava o estande do Paraná, que tinha os livros de obras sobre o estado e títulos de autores paranaenses, e ainda convivia com os responsáveis pela Feira do Livro de Porto Alegre, o maior evento literário a céu aberto realizado nas Américas.

Tudo, absolutamente tudo, em Porto Alegre se fez, naquele contexto, lindo diante das minhas retinas. O Rio Guaíba, as ruas, as pessoas, a comida, a bebida, Porto Alegre, de maneira geral, foi o cenário de uma de minhas temporadas mais incríveis no planeta.

Mas aquilo tudo teve um fim, voltei para o Paraná e oito anos se acumularam no meu caminho.

Naquele tempo, início dos anos 2000, eu já escrevia ficção: há exatos 20 anos produzo, continuamente, contos. No feriado. No fim de semana. E principalmente de segunda a sexta-feira. Publiquei em jornais e revistas, até mesmo em sites, mas evitei ao máximo ter um livro publicado. Até que agora, em 2010, tive uma surpresa imensa.

Após enviar sete contos para a Editora Record, uma tarde, recebi a informação de que o meu livro seria publicado.

Minda-Au, reunião de meus contos, já saiu, está nas vitrines e prateleiras de inúmeras livrarias de todo o Brasil. Há mais de 30 dias que a obra apareceu e até agora ainda não absorvi o fato.

Há uma semana, retornei a Porto Alegre. Dessa vez, como autor convidado para falar em duas mesas em meio à programação oficial da 56.ª Feira do Livro de Porto Alegre. Ao chegar ao saguão do Aeroporto Salgado Filho, uma placa com o meu o nome, nas mãos de um sujeito do receptivo da feira, mostrava que algo mudou depois que o livro chegou.

A cidade para onde fui, a capital gaúcha, talvez seja a mesma, a Feira de Poa, também. Multidões pela Praça da Alfândega em busca de um livro ou das palavras de um autor que, como eu, foi convidado e escalado pela Câmara Rio-grandense do Livro para falar sobre algo que diz respeito ao evento que leva as pessoas para as ruas do centro de Porto Alegre e que se irmanam devido ao efeito da feira.

Ao caminhar pelas ruas gaúchas comecei a me dar conta que o que mudou, se é que houve transformação, foi algo que aconteceu comigo. Estou menos ansioso, não quero aproveitar ao máximo tudo, como se o tudo fosse acabar. Em 2002, eu quase não dormia e estava o tempo todo interessado em conhecer uma rua, um parque, um museu, um algo qualquer; hoje já consigo sorver apenas uma rua ou uma praça.

Dessa vez, não saí de táxi em busca de algo que talvez nem tenha perdido na capital gaúcha. O entorno da Praça da Alfândega, onde fiquei alojado, foi mais do que suficiente.

O mundo pode ter se modificado demais nesses oito anos, tecnologias chegaram, mudaram, mas depois de ter voltado a Porto Alegre, agora com livro publicado, senti eu mesmo que já sou outro, diferente, mas também igual, parecido com o menino que um dia fui e que pretendo continuar sendo.

Crônica publicada na página 5 da edição do sábado 20 de novembro de 2010 do Caderno G, suplemento de cultura da Gazeta do Povo.

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