Outras dezessete noites em A nova crítica
Sérgio Tavares leu e fez uma resenha de Outras dezessete noites, publicada dia 16 de maio de 2017 no jornal Diário do Norte do Paraná, de Maringá, e no site A nova crítica.
O texto crítico pode ser lido neste link ou abaixo:
A literatura do curitibano Marcio Renato dos Santos
faz parte de uma tradição do conto que se aproxima da crônica.
Narrativas cuja origem está no olhar afiado sobre os cenários reais e as
pessoas, alcançando um efeito semelhante ao da captura fotográfica.
Um trabalho de escrita que, embora cuidadoso,
paciente, examinador, funciona em prol de uma prosa leve e ágil,
constituída por frases enxutas que desenvolvem o enredo ora pelo teor
descritivo ora por meio da ação. Outras dezessete noites, recém-lançada coletânea do autor, é um passo adiante nessa empreitada.
O título faz alusão ao Livro das mil e uma noites,
no qual a personagem Sherazade prende a atenção do tirano rei Sahriyar,
com histórias que se prolongam sem desfecho por dias. Marcio Renato
emula o mesmo artifício, ao se valer de senhas que fornecem um sentido
de unidade entre os contos. Do mesmo modo, os fios condutores de suas
tramas nunca partem de um início rumo a um final. O que se vê são textos
que cingem um recorte de tempo, sugestionando ao leitor uma
continuidade além de seus limites.
É o caso de “O benefício da dúvida”, que abre o
livro. O narrador, um jovem repórter, refaz os caminhos da amizade entre
dois jornalistas veteranos, dos quais um estará ao seu lado na execução
do texto seguinte, “Outra miséria”. O mesmo ocorre com o trio “O voo de
Ryouji”, “Essa é a nossa canção” e “Mixed emotions”. Ainda que
distintas em tema e estilo, as narrativas têm a música (a sentida, a
tocada, a escrita) agindo como elemento de conexão.
Outros registros de canções emergem aqui e acolá: Lou
Reed, Titãs, Legião Urbana. Esses contos, porém, concentram-se na
interação entre personagens, evocando a dinâmica da quadrilha
drummondiana. “Maria” é sobre cinco pessoas que se conhecem num mesmo
instante e os efeitos a longo prazo desse encontro casual, enquanto
“Daqui a alguns degraus” funciona no giro de posições entre três
mulheres na antecedência de uma reunião importante.
“Porta aberta”, por outro lado, segue os saltos de
observação de um núcleo familiar, detendo-se às atitudes do patriarca,
um homem bem-sucedido que, de uma hora para outra, resolve largar tudo e
se tornar invisível para o mundo. Marcio Renato se prova hábil na
construção de personagens a partir de seus dramas. “Homem-pássaro” tem a
confissão de atos funestos como mote para uma possível tragédia, ao
ponto que “João Nulo” é o retrato de alguém sem as rédeas do próprio
destino.
Em seus últimos textos, a coletânea parece tomar
emprestado o argumento de sua antecessora “Mais laiquis”, de 2015,
centrada nas mudanças de comportamento trazidas pela internet. “Deu ruim
(Vendetta)” mostra um narrador ciente de que está no universo da ficção
e planeja burlar essa condição. Já “Na rede, na onda”, é uma análise
sardônica dos escritores que se utilizam das redes sociais para cavar
popularidade à base de polêmicas. Preciso fazer barulho no Face para ganhar alguma coisa, qualquer coisa, dispara.
Com a morte do sergipano Antonio Carlos Viana, em
outubro passado, a literatura brasileira perdeu um autor que se dedicou
exclusivamente ao conto. Outras dezessete noites confirma o quão é importante o trabalho de Marcio Renato dos Santos, elevando o gênero ao patamar que merece.
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