No Leblon

Entro no prédio e a mulher da portaria pergunta onde vou. Ela ainda não me conhece.
– Vou no 30.789.
Também digo, e nem precisava ter tido, que vou levar um arquivo.
– De que tamanho?
Tiro um pen drive do bolso e mostro pra ela.
– Esse aqui.
Sigo até o elevador.
Entro, aperto o número 3.
O elevador sobe e em segundos estou no terceiro andar.
Caminho sete, oito passos, tiro a chave do bolso, abro a porta.
Pronto.
Estou dentro do meu apartamento.
Só consigo ficar em pé aqui.
Mas realizei um sonho antigo. Agora, moro no Leblon. Sim. Na Zona Sul do Rio de Janeiro.
Adquiri um espaço. Comprei um metro quadrado por R$ 21 mil. Vinte e um mil reais.
Investi nesse projeto quase o todo o dinheiro que economizei em vinte e um anos de trabalho.
Quer mandar uma carta pra mim? Agora meu cep é vinte e dois mil.
De onde moro, basta seguir por duas quadras e já estou de frente pro mar. A água é gelada. Mas é a orla do Leblon.
Desde que pisei nesse calçadão pela primeira vez, isso foi em 1992, decidi que um dia eu deixaria Curitiba no passado pra viver aqui.
E demorou.
Estive outras vezes no Rio e, em toda passagem pela cidade, eu refazia a promessa: morar no Leblon.
É praia com opções urbanas. As bancas de jornal são a prova de que o Leblon é cosmopolita. Tem revistas europeias, jornais norte-americano, argentinos e livros. Tanta porta comercial, sapateiro, chaveiro e bancos.
Almocei em um restaurante, não veio muita comida no prato, e paguei uma conta que levou mais dinheiro do que gasto em um mês.
Em geral não almoço – mastigo uma coxinha, um pastel e bebo um refri de 300 ml.
O importante, o que importa mesmo é essa paisagem – é respirar essa maresia.
Vejo tanta gente e enxergo uns famosos. Pessoal da televisão, apresentadores, cantoras, atrizes, modelos, figurantes. Eles passam e não me veem, mas os outros, os não famosos, também não percebem a minha presença. Sorriem uns para os outros, menos pra mim. Nunca me convidaram pra ir na casa deles, nunca me convidarão, mas parecem simpáticos – e essa simpatia quase me comove.
O dinheiro que sobrou da compra do imóvel me garante comida e bebida e sobrevivência até a Copa. Depois? Não sei. Mas até lá quero fazer o que mais gosto, que é seguir na cidade.
 Antes da mudança, imaginava que, aqui, eu iria beber o tempo todo. Mas parei com cerveja, chope e vinho desde o dia em que me instalei nesse um metro quadrado da Aristides Espínola.
Agora só bebo água e tomo um, dois, três banhos por dia – apenas no mar.
Pego umas ondas, esses jacarés eu pego, só não peguei nenhuma mulher aqui no Rio. E são tantas. Na areia, na calçada, na Delfim Moreira, na Pizzaria Guanabara, no Fratelli.
Ainda não visitei o Cristo Redentor, o Pão de Açúcar nem o Maracanã. Talvez, na Copa, quem sabe?
Por enquanto, sobrevivo – vou em frente. Toda quarta e sábado aposto na Mega-Sena. Vai que eu ganho? Daí eu compro uma cobertura, com piscina, quatro quartos e vista pro mar por R$ 30 ou 40 milhões.
Já pensou?
Eu com grana, no Leblon, na Copa?

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“No Leblon” foi publicado originalmente na página 65 da revista Ideias (Travessa dos Editores), edição 142, de agosto de 2013.

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