As maçãs de antes

 

Hoje tem As maçãs de antes (Biblioteca Pública do Paraná, 2012), da Lila Maia:

O título sintetiza a proposta da poeta: revisitar o que teve sabor no passado, por exemplo, o convívio com a doce mãe que já se foi, especialmente em "Cartas poéticas para Maria dos Remédios": "Mãe/ não se pode amar o tempo todo".

São muitas as qualidades desta obra, escolhida – entre outros – por Antonio Carlos Secchin e Heloisa Buarque de Hollanda como a vencedora do Prêmio Paraná de Literatura 2012 na categoria poesia – As maçãs de antes teve outra edição em 2014, pela Oficina Raquel.

Destaque, sem dúvida, são os magistrais versos – basta ler (ao acaso) cinco, seis, sete deles, ou menos, mesmo em fragmentos, como vou recortar neste comentário, para ter acesso à potência da poesia de Lila Maia.

Os desastres afetivos, melhor dizendo, a impossibilidade do amor a dois (contínuo) é mote recorrente em A maçã de antes – em alguns casos ironia e/ou humor relativizam o impasse, como no início do "Poema à moda de Shakespeare": "O meu feio Romeu não me reconhece mais".

Se, como o poema "Aceitação" insinua, "saudade não se mata, se aumenta", o inventário de desenganos é tecido por meio de imagens, como se lê em "Poema quase feliz" ("Era um elefante o amor por aquele homem.") e em "Opostos" ("Temos em comum mais naufrágios do que mar.").

No entanto, o ponto de excelência desta excelente obra é  "Mercado de trabalho", em que a voz poética relata as adversidades de uma mulher madura e com repertório ("Quatro anos de Letras,/ mais dois de Pós em Literatura Portuguesa,/ o curso completo de inglês no IBEU") incapaz de permitir que a sua mesa seja invadida por "iogurtes, queijo branco, uvas, kiwi, pêssegos,/ mamão com mel".

O que impede, especificamente, que ela seja contratada para o trabalho de Call Center na empresa Silva Lins é o mundo inimigo materializado em uma determinada concorrência:

"E a menina ao meu lado/ estudante de Propaganda e Marketing na Estácio,/ saia justa, corpo bronzeado de Ipanema,/ um quê de rouquidão forçado no final das frases,/ sai com carteira assinada e setecentos reais por mês."


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