A hora dos ruminantes

 

Hoje tem A hora dos ruminantes (Companhia das Letras, 2015), de José J. Veiga:

O aparecimento de desconhecidos, e o temor do que eles possam vir a fazer, desestabiliza os moradores de Manarairema, cenário de A hora dos ruminantes, narrativa de José J. Veiga (1915-1999) publicada em 1966:

Com variados pontos de vista, o enredo revela como a presença dos invasores transforma o cotidiano da cidade inventada pelo escritor goiano que se radicou no Rio de Janeiro:

"Havia também os que não se importavam com os homens da tapera, ou achavam que podiam viver sem tomar conhecimento deles. Pedrinho Afonso era um desses."

Ainda é possível ter acesso ao imaginário de Manarairema, por exemplo, por meio de uma das falas do personagem Amâncio, em que o interlocutor é Apolinário:

"– Você não precisa ter tanto medo deles. Até que eles ainda não fizeram mal a ninguém. São gente educada, sabem conversar sem ofender."

E, então, Manarairema sofre um literal ataque dos cães:

"No dia seguinte a cidade se esforçou por voltar à vida normal, e ninguém quis falar nos cachorros; mas a lembrança deles estava em toda a parte, no estrume deixado nos corredores das casas, nas calçadas, na grama do largo; no cheiro de urina que empestava todos os cantos; nos riscos de unhas feitos nas portas e paredes; nas penas de galinha espalhadas pelos quintais e que até ainda voavam no ar, no espanto ainda visível nos olhos das crianças e no constrangimento dos adultos."

O enredo concentra-se no tempo presente de uma crise em um pequeno povoado que, enfim, também vai passar por um lockdown a partir do momento em que acontece o que está anunciado no título da obra:

"Não se podia mais sair de casa, os bois atravancavam as portas e não davam passagem, não podiam; não tinham para onde se mexer. Quando se abria uma janela não se conseguia mais fechá-la, não havia força que empurrasse para trás aquela massa elástica de chifres, cabeças e pescoços que vinha preencher o espaço."

Obra mais conhecida do autor, A hora dos ruminantes ainda recupera expressões da coloquialidade e com potente metáfora e tanta linguagem afirma-se como manifestação de excelência e incontornável da literatura brasileira.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Livro sobre o skate no Paraná será lançado durante a 42.ª Semana Literária Sesc & Feira do Livro, em Curitiba