À sombra dos viadutos em flor
Hoje tem À sombra
dos viadutos em flor (SESI-SP Editora, 2018), do Cadão Volpato:
O ritmo é o de um (bom) romance, daqueles que não te
deixam interromper a leitura. E por materializar informações e nuances sobre a
passagem do tempo, te faz ver, sem necessariamente repetir, neste caso, a desgastada
frase de que se trata de um texto cinematográfico, apesar de tanto cinema dar
espessura a esta narrativa.
Cadão Volpato edita fragmentos de seu percurso, com uma
abertura (a palavra é essa mesma, não tem outra) felliniana (ou seria
volpatiana?) em que o pai (recorrente no imaginário do autor) aparece (de fato,
fellinianamente) em uma chaminé.
O que a leitora e o leitor vão encontrar nas páginas de À sombra dos viadutos em flor são
caminhos que levaram Cadão a materializar o Fellini, uma das mais brasileiras
entre as bandas brasileiras, apesar das marcantes referências europeias, entre
as quais, Gang of Four e The Stranglers.
Fellini também era (e continua sendo), mesmo com o encerramento
das atividades e eventuais retornos, uma banda literária (se é que é possível
dizer isso) – o texto das canções talvez anunciasse o futuro e atual escritor
Cadão Volpato.
Fato é que as letras, além de melodias, apresentam
imagens e construções peculiares e elegantes, basta conferir fragmentos, por
exemplo, de "Rock europeu" (E só dentro de um hospício/ Se vive na
América/ Viver num hospício é melhor/ Que
num pardieiro") ou "Rio-Bahia" (Só um primo em frente ao
convento/ Do Rio de Janeiro à Bahia/ Eu barbudo e seus braços abertos/ E morros
e morros e morros").
À sombra dos
viadutos em flor tem como cenário, principalmente, um apartamento que
Cadão dividiu com amigos, ensaios nos sábados em que nunca chovia, domingos de
levar a roupa para a sua mãe lavar, e flashes dos corredores da
revista Veja, onde ele atuou e diz
ter visto, por exemplo, o general Figueiredo ("Tancredo Never")
sentar (despachando?) na cadeira do diretor de redação.
Parte significativa do texto se dá a partir da relação
do autor com uma namorada, não identificada, com quem ele amadurece
emocionalmente, uma companheira de viagem na solidão de São Paulo e seus
viadutos, sonhos, naufrágios e sorrisos.
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