Câmera Lenta

 

Hoje tem Câmera Lenta (Companhia das Letras, 2017), da Marília Garcia: Tanta beleza com inesquecíveis sugestões visuais.

Assim podem ser compreendidos os poemas desta obra: "imaginem que isso aqui é um quadrado/ com drones volantes,/ ou um cena congelada/ com o céu cheio de zepelins", podemos ler (ver) em "hola, spleen".

O reincidente verbo ver aparece em "pelos grandes bulevares" ("o que ela vê quando fecha/ os olhos? linhas sinuosas, um mapa"), em "é uma love story e é sobre um acidente" ("o amor, diz, é um efeito especial,/ pensa que viu tudo/ mas quando acende a luz/ os pontos/ cegos se espalham"), em "em lopp, a fala do soldado" ("vivo numa caixa preta/ de vinte centímetros./ vejo o mundo por um visor") e em outros textos de Câmera Lenta.

A leitura sugere, a releitura pode confirmar, que os poemas deste livro, entre outros efeitos, descrevem e fixam cenas, como em "tem país na paisagem? (versão compacta)":

"aqui só tenho uma regra:/ todos os dias às 10h/ tiro uma foto da ponte./ o resto é livre e gira/ em torno da pergunta: como ver o tempo/ passar neste lugar?/ penso no infra-/ -ordinário do georges perec/ e todos os dias/ vou até a ponte/ e tiro uma foto/ que possa me dizer/ alguma coisa/ sobre estar aqui".

Já o último e extenso poema, "estrelas descem à terra (do que falamos quando falamos de uma hélice)", transita por questões como deslocamento, possíveis sonhos reincidentes e ideias-fixas, discute a escrita e revisita sensações que acompanham uma poeta em performances diante de eventuais plateias:

"vocês podem pensar na imagem que quiserem/ enquanto prosseguimos/ mais ou menos assim:/ cada pedaço de texto como este/ deve ter uma ou mais imagens/ correspondentes".

Mas, e isso precisa ser enunciado, em algum momento da leitura ficam evidentes duas outras questões.

Um poema pode chamar o outro, o próximo – e assim Câmera Lenta se faz (também) como uma narrativa formada pela sequência de textos poéticos.

E, algo que soa desde o primeiro verso, além da sugestão visual, os poemas deste livro são excepcionalmente sonoros – e com todos os méritos Câmera Lenta (Marília Garcia) foi a grande vencedora do Prêmio Oceanos 2018.

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