Dúvidas apócrifas de Marianne Moore

 

Sempre evitei falar de mim,

falar-me. Quis falar de coisas.

Mas na seleção dessas coisas

não haverá um falar de mim?


Não haverá nesse pudor

de falar-me uma confissão,

uma indireta confissão,

pelo avesso, e sempre impudor?


A coisa de que se falar

até onde está pura ou impura?

Ou sempre se impõe, mesmo impura-

mente, a quem dela quer falar?


Como saber, se há tanta coisa

de que falar ou não falar?

E se o evitá-la, o não falar,

é forma de falar da coisa?


Dúvidas apócrifas de Marianne Moore, poema do João Cabral de Melo Neto.

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